A minha história com os negócios sociais (ou de impacto ou empresas sociais)
Se você me conhece um pouco mais de perto, sabe da minha relação longínqua com o voluntariado e com projetos socioambientais.
Eu sempre fui ligada ao terceiro setor. Participei de trabalhos voluntários em diversas áreas. Ajudei com a alfabetização de algumas crianças em creches, jogava cartas e conversa fora com velhinhos em asilo, participei de alguns eventos especiais em hospitais de câncer e abrigos infantis, entre outros.
Enfim, isso não é uma propaganda pessoal. É, sim, uma forma de te contar como eu conheci os negócios de impacto e o porquê comecei a estudá-los. (também tem o propósito de te convidar a abrir o coração para essas causas... tanta gente precisando desse seu tempo e afeto...)
Há aproximadamente dez anos, participei de uma reunião de Direito e Terceiro Setor organizada pela OAB/SP. Nela, tive o prazer de escutar o André Palhano, que havia, há pouco tempo, fundado a Virada Sustentável. A conversa com ele foi inspiradora, mas nada se compara a uma de suas falas finais. Ele disse algo parecido com: Eu sei que vocês estão aqui, atuando em prol do terceiro setor, mas comecem a estudar mais sobre os negócios e as empresas sociais.
O André não sabe, mas, naquele momento, apresentou-me para um mundo que unia tudo aquilo que eu sempre acreditei e queria entender como poderia funcionar: um negócio que atuaria sim como uma verdadeira empresa, mas que teria como atividade e valor principal resolver problemas socioambientais. Era uma forma perfeita de unir o propósito do terceiro setor com a possibilidade de desenvolvê-lo de uma forma mais empresarial, para tentar minimizar as dificuldades de captação de recursos e profissionalização enfrentadas por muitas instituições não governamentais.
A partir daquele momento, comecei a estudar e me aproximar desse novo mundo e a me realizar com a qualidade de iniciativas que já tínhamos no Brasil. Os estudos renderam-me até mesmo um trabalho de conclusão de minha pós-graduação em Direitos Difusos e Coletivos e, com ele, o recebimento do Prêmio de Finanças Sociais e Negócios de Impacto do Instituto de Cidadania Empresarial (em 2015).
Mas, afinal, o que são as empresas sociais?
Diversas denominações são utilizadas para tratar das empresas sociais, como negócios sociais, social enterprise, empreendedorismo social, negócios inclusivos, social purpose venture, caring capitalismo, civic entrepreneurship, entre outros.
O meu conceito juridiquês: “pessoas jurídicas de direito privado, constituídas sob a égide das normas que regem as sociedades personificadas, que exercem atividade econômica lucrativa de produção e/ou circulação de bens e serviços, a qual possui como objetivo primordial a geração direta de benefícios sociais para pessoas de menor potencial aquisitivo, possibilitando a sua inclusão no mercado de trabalho, como empregados ou empreendedores, ou propiciando o seu acesso ao consumo e a concretização de seus direitos fundamentais sociais, dentre eles, a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia e o lazer.”.
O que isso significa: são empresas, cujo negócio principal é vender um produto ou serviço que resolva problemas socioambientais das populações que possuem menor potencial aquisitivo.
Principais características: propósito social e ambiental definido e sua gestão deve sempre seguir esse objetivo; comercializam produtos e serviços; maior parte do quadro de funcionários é de assalariados, não contando com trabalho voluntário como acontece com muitas organizações sem fins lucrativos; processo de tomada de decisão baseado no propósito sócioambiental, a fim de que questões econômicas não sejam postas em primeiro plano e não se desvirtue o comprometimento da empresa com os seus valores.
Posso ter uma empresa de impacto e distribuir lucros para os sócios?
Muhammad Yunus[1] defende que todo o lucro deve ser reinvestido na atividade da empresa, para que não se corra o risco de desvirtuar o propósito pelo qual foi criada;
Stuart L. Hart e Michael Chu[2] defendem que o objetivo de lucro acelera o resultado social positivo e a transformação rumo à sustentabilidade global. Então, pode ter distribuição de lucros aos sócios.
Minha singela opinião: sim, você pode distribuir lucros para os sócios. Entendo que essa possiblidade torna o campo das empresas sociais mais atrativo para os empreendedores e investidores, fomentando esse setor, e, por conseguinte, gerando inclusão social de consumidores antes excluídos do mercado, empregos para a população de baixa renda, riqueza e poupança de valores, etc. Mas, penso ser essencial que se fixe no contrato social que a maior parte do lucro será reinvestida na atividade econômica e que a menor parte será distribuída aos sócios (por exemplo, 80% x 20%)
Existe alguma lei específica que rege as empresas sociais no Brasil? Não! Na minha opinião, também não é uma legislação necessária. Com alguns ajustes no contrato social e utilizando as espécies de pessoa jurídica já existentes no Brasil, é possível constituir e bem gerir uma empresa de impacto. (Há bastante discussão sobre essa questão, ok?) O que falta, em minha opinião, é uma autorregulamentação para que o setor se desenvolva mais e seja fomentado, com normas criadas pelos próprios atores desse segmento.
Exemplos de negócios de impacto no Brasil
Banco Pérola: concede créditos para micro e pequeno empreendedor. Além do crédito, orientam o empreendedor em como melhor geri-lo e investi-lo no negócio.
Rede Asta: vende produtos fabricados por comunidades de baixa renda.
Clube da Preta: assinatura de produtos da moda, arte e cultura feitos por afroempreendedores e entregue mensalmente em sua casa.
MoléCoola: programa de reciclagem, em que a pessoa leva os materiais aos postos de coletas e recebe pontos que podem ser trocados por produtos de empresas parceiras.
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